

Mexicanos elegem juízes em votação com pouca participação e sob sombra da corrupção
Com indícios de baixa participação e demoras de até 26 minutos para marcar os votos em numerosos cargos, os mexicanos votam neste domingo (1º) em eleições únicas no mundo para escolher todos os juízes do país.
Repórteres da AFP constataram, com funcionários de seções eleitorais do centro da Cidade do México, que a participação era menor que 10% dos eleitores registrados, durante a primeira metade da jornada de votação de 10 horas.
Leslie Moreno, advogada de 30 anos, disse que votar foi "mais trabalhoso" do que em eleições de autoridades políticas.
"Você não conhece os candidatos, exceto os que faziam vídeos no TikTok", acrescentou fazendo alusão a um dos meios de promoção que alguns aspirantes utilizaram diante das restrições para fazer propaganda.
A inédita votação marcou o reaparecimento, após oito meses de ausência da vida pública, do ex-presidente Andrés Manuel López Obrador (2018-2024), arquiteto da controversa reforma judicial que instaurou a eleição dos juízes.
"É a primeira vez na história, por isso quis participar", disse o ex-mandatário a jornalistas após votar no estado de Chiapas.
Analistas apontam que o constante confronto de López Obrador com os tribunais, que bloquearam muitos de seus projetos de governo, foi o principal motivo da reforma.
Para sua sucessora e discípula Claudia Sheinbaum, a votação é uma forma de combater a corrupção enraizada e a impunidade do sistema judicial.
Mas também gera preocupações sobre a independência da magistratura e se facilitará a influência de criminosos nos tribunais com ameaças ou subornos.
Sheinbaum afirma que só quem deseja manter a "corrupção e os privilégios" do Poder Judiciário alega que a eleição é "arranjada" para favorecer o partido governista.
"Nada mais falso", disse a presidente de esquerda em um vídeo divulgado neste sábado. Ela votou em um local próximo ao palácio presidencial, entre aclamações de seus simpatizantes.
- A favor e contra -
Arturo Giesemann, aposentado de 57 anos, declarou que sua maior motivação para votar é "o nojo" que sente "pelo Poder Judiciário atual", administrado "por corruptos".
Em contraste, centenas de mexicanos que "repudiam" Sheinbaum e qualificam a eleição como uma "farsa" do governo para controlar a Justiça marcharam neste domingo pelo central Paseo de la Reforma, constatou a AFP.
Para Ismael Novela, de 58 anos, as eleições mandam "para o túmulo" o Poder Judiciário. "Era o último contrapeso que tínhamos contra o totalitarismo do Poder Executivo", declarou.
Especialistas alertam que a eleição popular é um método de seleção mais fácil de ser infiltrado pelo crime organizado em comparação com outros formatos, como o concurso e a carreira judicial.
Implica, além disso, "um risco de que o eleitorado não escolha os candidatos com base no mérito", explicou à AFP Margaret Satterthwaite, relatora especial das Nações Unidas sobre a independência de juízes e advogados.
Já o governo retruca que essa corrupção já existe nas cortes e que a eleição de candidatos permitirá maior escrutínio.
- "Boa reputação" -
Neste domingo, são eleitos cerca de 880 juízes federais - incluindo ministros da Suprema Corte -, assim como mais de 1.700 magistrados regionais para 19 estados. Outra eleição para as entidades restantes será realizada em 2027.
Aos candidatos pede-se diploma em direito, experiência e "boa reputação", assim como não ter antecedentes criminais.
De Guadalajara, Luis Méndez, engenheiro de 62 anos, disse que sua motivação para votar é o "desastre" do Poder Judiciário. "É um poder muito corrupto que tem prejudicado a nação por muitos anos", afirmou.
O Instituto Nacional Eleitoral (INE), que por sua complexidade classificou a eleição como "um desafio sem precedentes", estima que na consulta participarão entre 13% e 20% do eleitorado.
Para David Shirk, pesquisador sobre o Judiciário mexicano da Universidade de San Diego, nos EUA, o grosso da composição judicial se concentra nas forças de ordem e nas promotorias, não nos tribunais.
Q.Wright--VC