

Guerra em Gaza amplia as divisões em Israel
À medida que se prolonga, a guerra na Faixa de Gaza coloca amigos e parentes em lados opostos e acentua as divisões políticas e culturais em Israel.
As famílias e os ativistas pela paz desejam que o governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu alcance um cessar-fogo com o Hamas e que o grupo islamista liberte os reféns capturados no ataque de outubro de 2023, que desencadeou o conflito.
Ao mesmo tempo, os integrantes de direita do gabinete de Netanyahu querem aproveitar o momento para ocupar e anexar mais territórios palestinos, sob o risco de provocar novas críticas internacionais.
O debate dividiu o país e tensionou as relações mais íntimas, abalando a unidade nacional em um momento de grande necessidade para Israel durante sua guerra mais longa.
"À medida que a guerra continua, nos dividimos cada vez mais", disse Emanuel Yitzchak Levi, poeta, professor e ativista de 29 anos, que integra a esquerda religiosa israelense, ao participar em uma manifestação pela paz na Praça Dizengoff, em Tel Aviv.
"É muito difícil continuar sendo amigo ou parente, um bom filho, um bom irmão de alguém que, do seu ponto de vista, apoia crimes contra a humanidade", afirmou à AFP. "E acho que também é difícil para eles me apoiarem se acharem que traí o país".
Para enfatizar este ponto, um ciclista, irritado com a manifestação, parou sua bicicleta para gritar "traidores" aos participantes e acusar os ativistas de colaboração com o Hamas.
- Polarização -
Dvir Berko, um trabalhador de 36 anos de uma das muitas startups de tecnologia da cidade, também parou no centro de Tel Aviv para compartilhar uma crítica mais razoável ao apelo dos ativistas por um cessar-fogo.
Berko e outros acusaram os organismos internacionais de exagerar a escassez de alimentos em Gaza e afirmaram à AFP que Israel deveria reter a ajuda até a libertação do 49 reféns restantes.
"O povo palestino é controlado pelo Hamas. O Hamas tira a comida deles. O Hamas iniciou esta guerra e, em todas as guerras, acontecem coisas ruins. Não se enviam flores ao lado contrário", argumentou. "Eles devem perceber e compreender o que vai acontecer depois".
As vozes em Tel Aviv refletem uma polarização cada vez maior na sociedade israelense desde que os ataques do Hamas, em outubro de 2023, deixaram 1.219 mortos, disse à AFP o jornalista independente Meron Rapoport.
Rapoport, ex-diretor de redação do jornal de centro-esquerda Haaretz, destaca que Israel já estava dividido antes do conflito e havia registrado grandes protestos contra a corrupção de Netanyahu e as ameaças percebidas à independência judicial.
O ataque do Hamas desencadeou inicialmente uma onda de unidade nacional, mas à medida que o conflito se prolonga e a conduta de Israel é alvo de críticas internacionais, as atitudes da direita e da esquerda ficaram cada vez mais distantes.
- Apoio às famílias dos reféns -
Segundo uma pesquisa realizada entre 24 e 28 de julho pelo Instituto de Estudos de Segurança Nacional, com 803 entrevistados judeus e 151 árabes, os israelenses consideram por uma pequena margem que o Hamas é o principal responsável pela demora na concretização de um acordo para a libertação dos reféns.
Apenas 24% dos judeus israelenses se sentem "angustiados" ou "muito angustiados" com a situação humanitária em Gaza, um território "ameaçado pela fome" segundo a ONU.
Contudo, há apoio para as famílias dos reféns israelenses - muitas acusam Netanyahu de prolongar a guerra artificialmente para reforçar sua posição política.
Em uma carta aberta publicada na segunda-feira, 550 ex-militares, chefes de inteligência e diplomatas de alto escalão pediram ao presidente americano, Donald Trump, que convença Netanyahu que a fase militar da guerra já foi vencida e que agora ele deveria se concentrar em um acordo para a libertação dos reféns.
O arqueólogo bíblico Avi Ofer, 70 anos, atua há muito tempo em uma campanha pela paz entre israelenses e palestinos. À beira das lágrimas, ele disse à AFP: "Este é o período mais terrível da minha vida".
"Sim, os integrantes do Hamas são criminosos de guerra. Sabemos o que fazem. A guerra foi justificada no início. No início, não era um genocídio", afirmou.
O escritor israelense David Grossman declarou o mesmo em uma entrevista na semana passada ao jornal italiano La Repubblica.
"Eu me neguei durante anos a usar este termo: 'genocídio'. Mas agora não posso evitar usá-lo, depois do que li nos jornais, depois das imagens que vi e depois de conversar com pessoas que estiveram lá", explicou Grossman.
C.Brown--VC